september 22, 2009

Pagamento de direito autoral por estabelecimentos comerciais-STJ

Sonorização em ambiente comercial implica pagamento de direito autoral



Hotéis, motéis, restaurantes, lanchonetes, bares, boates, butiques. Não importa qual o segmento do estabelecimento comercial: se transmite obra musical para entreter a clientela, deve pagar direitos autorais ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad). O Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem entendendo dessa forma em diversos julgados, tanto que já editou súmula sobre a matéria desde 1992.

A Súmula n. 63/STJ determina: “são devidos direitos autorais pela retransmissão radiofônica de músicas em estabelecimentos comerciais”. Vários são os julgamentos que corroboram esse entendimento.

Antes de 1990, contudo, a Terceira e a Quarta Turma divergiam quanto à matéria. De um lado, a Terceira Turma considerava que a sonorização em ambientes comerciais só acarretaria pagamento de direitos autorais se ocasionasse lucro direto ao comerciante. A conclusão seguiu orientação do ministro Waldemar Zveiter segundo a qual “se a música é elemento substancial, atrativo para a captação de clientela, a cobrança é procedente; se é apenas executada como forma de entretenimento, sem que isso importe especificamente na exploração da atividade-fim do estabelecimento, a cobrança desses direitos se afigura uma demasia”. Vários ministros entendiam nessa linha, a exemplo dos ministros Nilson Naves e Gueiros Leite.

Em outro caso, o ministro Fontes de Alencar afastou a cobrança em relação a uma sapataria no julgamento de um recurso do qual era relator. Para ele, o ramo da empresa era vender sapatos e bolsas, e não executar músicas. “A música não se destaca como uma atração própria, por conseguinte não há obrigatoriedade do recolhimento dos direitos autorais ao Ecad”, afirmou.

Ainda que esse entendimento prevalecesse naquele colegiado, alguns ministros divergiam. Os ministros Cláudio Santos e Eduardo Ribeiro votaram pela cobrança. Para Cláudio Santos, o fato de o afluxo de pessoas, fregueses ou lucro aumentar ou não seria irrelevante: quando a lei fala de lucro indireto, não fala no que pode ser mensurado, mas da vantagem potencial, de um lucro que aquela música podia trazer ao ambiente.

Lucro indireto

Eduardo Ribeiro defendia que, ao transmitir a música em seu estabelecimento, o comerciante está se aproveitando do talento do artista para ampliar seus lucros. O ministro foi mais longe: se o empresário cobra pelo espetáculo ou se os restaurantes exigem couvert artístico, há lucro direto. Se a música é ambiental, visando tornar o local mais agradável, o lucro é indireto. Para ele, o objetivo do comerciante é aumentar a clientela.

A Quarta Turma, por unanimidade, era favorável à cobrança. O ministro Barros Monteiro defendia que o uso da música era para, não só tornar o ambiente mais agradável, mas captar clientela. O ministro Bueno de Souza afirmou que o fato de a empresa radiofônica já ter pago ao Ecad não autorizava ao usuário do aparelho receptor difundir, em iniciativa diversa da mera recepção, o som recebido para, a partir daí, tirar algum proveito.

Aí começava a se delinear a unificação da jurisprudência sobre o tema, que ocorreu no julgamento de embargos de divergência do recurso especial apreciado pela Terceira Turma. O ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira foi o relator e definiu: a utilização de música em estabelecimento comercial captada de emissoras de rádio sujeita-se ao pagamento dos direitos autorais.

A súmula foi pensada e editada sem fazer exceções à obrigação. Ainda assim, estabelecimentos comerciais da área de alimentação insistiam na tese de isenção. Em 1997, um hotel do Rio de Janeiro tentava convencer que não deveria pagar direitos autorais ao Ecad pela transmissão radiofônica no restaurante e na área de lazer, O relator, ministro Carlos Alberto Menezes Direito, aplicou ao caso a então recente Súmula n. 63, determinando o pagamento.

A rede de lanchonetes McDonald’s também já buscou se eximir da obrigação. A empresa defendia que a música no estabelecimento era irrelevante para a consecução de suas atividades uma vez que não fornece música, mas sim alimentos. O McDonald’s alegou que uma empresa do porte dela, uma das maiores redes de fast food do mundo, não obtém lucro por meio de eventual transmissão de música, mas sim pela venda de refeições rápidas.

A Quarta Turma, seguindo o voto do ministro Aldir Passarinho Junior, manteve a obrigação com o Ecad já garantida pela Justiça estadual: "qualquer casa comercial que use um fundo musical em suas dependências objetiva aumentar o fluxo de fregueses, proporcionar-lhes entretenimento, estender o tempo de permanência no estabelecimento, tornar o ambiente mais agradável e confortável, inclusive para os próprios funcionários, que têm melhores condições de trabalho e, consequentemente, ampliar os lucros”.

Mais recentemente, a ministra Nancy Andrighi, da Terceira Turma, destacou que, a partir de 1998, a legislação passou a conter o que o STJ já vinha decidindo há quase uma década. A Lei n. 9.610/98 – que alterou, atualizou e consolidou a legislação sobre direitos autorais – não considera mais relevante aferir lucro direto ou indireto pela exibição de obra, mas tão somente a circunstância de se ter promovido sua exibição pública em local de frequência coletiva.

A ministra era relatora do recurso interposto pelo Ecad contra uma churrascaria e concluiu ainda: O mesmo raciocínio, portanto, deve ser estendido a restaurantes, já que nenhuma peculiaridade justificaria tratamento diferenciado para essas hipóteses.

E não importa se essa transmissão é feita na área interna do estabelecimento para que sejam garantidos os direitos autorais. O ministro Sálvio de Figueiredo assegura: as casas comerciais que propiciam música aos seus fregueses ficam obrigadas ao pagamento independentemente se a transmissão se dá “seja nas áreas comuns, seja em conferências, congressos, restaurantes, torneios esportivos e outros”.

Em outra ocasião, o ministro Passarinho reiterou essa avaliação: a sonorização ambiental nas áreas comuns do hotel, caso do bar e restaurante nele existentes, enseja o pagamento de direitos autorais.

O entendimento do STJ sobre a transmissão musical pelo comerciante em seu estabelecimento pode ser resumido em uma frase do ministro Eduardo Ribeiro: “Não há mal que o faça, mas é justo que pague por isso”.


Coordenadoria de Editoria e Imprensa

august 01, 2007

Ecad poderá ter que mostrar fórmulas de cobrança

Se Projeto de Lei for aprovado, órgão terá que publicar em seu site fórmulas de cálculo e cobrança dos direitos autorais
Alexandra Bicca, de Brasília
31/07 - 19:41

O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) - órgão responsável pelo recolhimento de direitos autorais pelo uso de músicas em rádios, clubes, casas noturnas e eventos - pode ser obrigado a publicar, em seu endereço eletrônico, como é feito o cálculo para cobrança e os valores cobrados pela utilização de conteúdos.

Tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília, o Projeto de Lei 818/07, do deputado Silvinho Peccioli (DEM-SP), tornando obrigatória a publicação destas informações. O autor da proposta questiona a atuação do órgão. Segundo ele, há muito tempo o trabalho do Ecad vem sendo motivo de discussões. "A atuação do Ecad gera polêmica entre artistas de todo o País", disse Peccioli.

Peccioli explica que a atuação do Ecad é prevista em lei, mas por se tratar de órgão particular defende o aumento do controle sobre o trabalho do escritório. O parlamentar defende a utilização da internet como ferramenta para agilizar a divulgação dos cálculos. Para o depuitado, com a aprovação do projeto, todos os interessados poderão acompanhar de perto o trabalho do escritório e verificar se os recursos estão sendo destinados para os detentores dos direitos autorais.

O projeto tramita em caráter conclusivo e será analisado pelas comissões de Educação e Cultura, de Constituição e Justiça e de Cidadania.



Meio&mensagem

april 27, 2007

Justiça do Rio mantém contrato entre TV Globo e Ecad

Parceria em questão
Justiça do Rio mantém contrato entre TV Globo e Ecad

O preço de uma obra musical, intelectual e artística deve ser fixado de acordo com o seu próprio valor e não pela capacidade econômica do comprador. O entendimento é da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que mandou o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) manter o contrato de autorização para execução pública de obras musicais, lítero-musicais e de fonogramas, assinado com a TV Globo, em junho de 2000.

Para o relator, desembargador Cláudio de Mello Tavares, a fixação do valor em 2,5% do faturamento bruto da emissora para que possa executar as obras é abusiva. "Há de se reconhecer que a fixação pelo Ecad do preço em percentual da receita bruta de cada emissora contratante constitui abuso dos direitos que lhe confere o parágrafo único do artigo 98, da Lei 9.610/98, em total infringência aos princípios da isonomia, da boa-fé e do equilíbrio econômico do contrato", afirmou.

Segundo a decisão, o procedimento adotado pelo Ecad afronta o parágrafo 4º do artigo 173 da Constituição Federal, bem como os artigos 421 e 422 do Código Civil. Além disso, o Ecad não apresentou qualquer razão plausível para demonstrar que o preço praticado anteriormente não correspondia a um valor justo.

Para o relator, ao determinar o percentual de 2,5% da receita da TV Globo, o Ecad está agindo como sócio da empresa. O órgão “está agindo não como um fornecedor de produto ou como uma entidade destinada a viabilizar a gestão coletiva de arrecadação e distribuição de direitos autorais e conexos, mas como um sócio da empresa, ou mesmo com mais direitos do que este, pois a retirada e/ou os lucros de cada sócio de uma empresa levam em consideração, também, as despesas da emissora", afirmou.

Revista Consultor Jurídico, 23 de abril de 2007

desember 01, 2006

Arte musical

Trabalho de DJ’s gera discussão sobre direitos autorais
por João Henrique Fragoso
Recentemente um grande jornal do Rio de Janeiro publicou uma matéria acerca da atividade dos DJ’s. Embora dela lembre apenas alguns detalhes, permaneceu em minha mente uma questão ali abordada: podem os DJ’s ser considerados músicos?
A matéria, aparentemente, foi motivada pela criação no prestigiado Berklee College of Music de um curso de “turntablismo”, onde são ensinadas técnicas envolvendo todos os elementos de manipulação e performance de um DJ: scratch, beat-matching e beat juggling, crossfader, cuing etc. (todos estes termos e sua explicação técnica foram retirados de matéria publicada no The Boston Globe, www.bostonglobe.com).
No Brasil já existem cursos de formação de DJ’s; sites especializados -- além de sites dos próprios DJ`s -- comércio de equipamentos e discos vinyl, publicações e programas de rádio e tv voltados para o setor, e uma associação de classe, caracterizando uma atividade intensa na área, com um também intenso intercâmbio internacional, além da proliferação de grandes eventos envolvendo a categoria.
Segundo o glossário que acompanha a matéria do The Boston Globe, turntablism significa a arte de utilizar um toca-discos como um instrumento musical. Este modo de utilização não é novo: John Cage já o fizera há décadas, em fins dos anos de 1930, e desde então tem sido utilizado do mesmo modo em diversas manifestações musicais. Atribui-se, entretanto, ao DJ Babu ter cunhado o termo turntablism, em 1995, definindo o turntablist como a pessoa que usa o toca-discos, não para reproduzir músicas, mas para “manipular sons e criar música”. Há, ainda, a elaboração de um conceito: o de que o DJ apenas executa músicas e o turntablista cria músicas.
A International Turntablist Federation define o turntablista como alguém que usa o toca-discos como um meio para executar, mixar, criar e orquestrar novas e originais composições musicais, concluindo que, ao usar as mãos para mover o disco para frente e para trás, manipulando ritmicamente os sons, atua como um violinista, um guitarrista ou um pianista. Ressalte-se que uns dos objetivos da ITF é o reconhecimento internacional do turntablist como um músico, e do turntable como um instrumento musical.
A conjunção desses elementos de definição do que seja um turntablista, na verdade, do que seja um DJ -- já que a expressão turntablista inexiste entre nós -- resulta em dois aspectos a que se visa analisar, a saber: i) o DJ como intérprete musical; e ii) o DJ como autor musical.
Ressalto, antes, que a questão não deveria passar por preconceitos de qualquer tipo, assim como aspectos de natureza estética devam ser afastados, uma vez que o objetivo é a avaliação fática e a tentativa de caracterização jurídica do fenômeno.
O DJ como intérprete musical
À parte o fato de ser o ou a DJ uma personalidade inserida no mundo artístico musical, basicamente da música popular, a questão é se a sua atividade pode ser interpretada como uma atividade de artista, em termos estritamente legais, e que tipo de artista é. A Lei nº 6.533/78 define o artista como todo o profissional que cria, interpreta ou executa obra de caráter cultural de qualquer natureza, através dos meios de comunicação de massa ou em locais onde se realizem espetáculos de diversão pública.
A Convenção de Roma (1961) da qual o Brasil é signatário, já estabelecera que se entende por artistas intérpretes ou executantes, entre outros, os músicos que interpretem ou executem obras literárias ou artísticas, entre estas últimas, as obras musicais. A Lei nº 9.610/98 (Lei autoral) absorveu o conceito da Convenção para a definição de artistas intérpretes ou executantes. A Lei n.º 3.857/60, que disciplina o exercício da profissão de músico não o define, apenas estabelece uma classificação de músicos, na qual encontram-se os compositores, os instrumentistas e arranjadores.
Independentemente do fato de estar o DJ enquadrado em qualquer das categorias acima, entendo que -- parafraseando Walter Moraes (in “Artistas, Intérpretes e Executantes”, Ed. RT, São Paulo, 1976) o músico é um “agente da arte musical” -- seja ele um compositor, um intérprete ou um arranjador, ou um DJ, completo. Como um agente dessa arte, sobre ela exerce algum tipo de intervenção. No caso específico do músico-intérprete ou executante, esta intervenção é mediada por um instrumento musical qualquer, sejam cordas, percussão, metais, madeiras ou a própria voz.
O objeto de minha dúvida, então, divide-se em dois: i) se um toca-discos e todo o conjunto de aparatos utilizado por um DJ (CD player, mixer, sampler, processadores de efeitos, computadores etc.) constitui um instrumento e; ii) em sendo um instrumento, qual a natureza da intervenção exercida pelo DJ.
É possível responder às indagações com base em meras observações: se existe uma obra pré-gravada, executada por meios eletro-mecânicos pelo toca-discos, e sobre cuja execução o DJ exerce uma intervenção, manipulando e ainda alterando a gravação original, de modo a produzir um novo som, certamente o toca-discos transforma-se em um instrumento musical e o seu manipulador em um intérprete (ou executante) musical.
Exemplos de manipulação por um indivíduo, de sons pré-gravados, justificam esta consideração, especialmente na chamada música concreta, que desde a década de 1940, com compositores como Pierre Schaeffer (França), desenvolveram o conceito de música concreta como o resultado de sons pré-gravados por instrumentos convencionais ou sons naturais e que depois são manipulados e montados para sua apresentação. O mesmo acontece com a música eletrônica, com a diferença de os sons pré-gravados, nesse caso, serem produzidos por instrumentos eletrônicos, como o sintetizador (Fonte: Dicionário de Música ZAHAR, 1982: verbetes música concreta e música eletrônica).
Ainda que possa causar espécie a alguns, o fato é que qualquer objeto, desde um pedaço de pau até o mais sofisticado aparelho que, de qualquer forma, produza sons que possam ser caracterizados como música, é um instrumento musical. Neste particular, nunca é demais lembrar certos músicos internacionalmente reconhecidos, como Hermeto Paschoal, Nana Vasconcelos, Uakti -- citando apenas alguns brasileiros -, que produzem música a partir dos mais inusitados objetos, como ossadas, utensílios domésticos, vasos de cerâmica, tubos plásticos etc.
É bem verdade que, ainda, muitos músicos bem formados rejeitam a atividade do DJ como sendo igual a de um músico -- apesar de muitos DJ’s possuírem sólida formação musical -- assim como, durante muito tempo, certa categoria de músicos, como os percussionistas, foi encarada por muitos de seus pares como “menor”, como o “pessoal da cozinha”. Poder-se-ia também dizer que o DJ sem formação musical não poderia ser considerado um músico, nem o toca-discos um instrumento, já que aquele seria incapaz de fazer música por qualquer meio se o seu aparelho fosse desligado da tomada.
Em contraposição -- como noticiou a imprensa especializada no assunto -- a França foi o primeiro país a reconhecer oficialmente a atividade, através de seu sistema governamental de comunicações e radiodifusão e, em 1999, a Comissão Canadense de Rádio-Televisão e Telecomunicações determinou que o turntablismo constitui um “gênero musical distinto”, na medida em que a música tenha sido resultado de uma criação realmente nova, a partir de uma significante alteração da gravação originalmente havida em suporte vinyl.
Ainda é digno de nota a realização do “Concerto For Turntable” (www.concertoforturntable.com ) obra dos DJ’s Radar e Raul Yanez, composto para turntable e orquestra sinfônica., com três movimentos, e apresentado ao público em março de 2001 pelo DJ Radar e seu turntable, com regência do maestro Joel Brown à frente da orquestra sinfônica da Universidade do Estado do Arizona, EUA. Hoje em dia é comum a presença de DJ’s como músicos acompanhantes, componentes de inúmeras bandas e artistas em atividade.
O toca-discos, em sua função passiva de mero reprodutor de sons, é apenas um aparelho. Quando é manipulado pelo DJ e com isto produzindo novos sons, resultado da alteração dos sons originalmente gravados, torna-se um instrumento. É dessa forma que se torna possível ver o DJ como um músico, logo como um intérprete ou executante musical, com todos os direitos ínsitos a esta categoria, previstos em lei, especialmente o direito de receber pela execução pública de suas interpretações, onde couber, nos termos da Lei n° 9.610/98 -- se e quando tais interpretações não firam os direitos de intérpretes (e produtores fonográficos) e eventualmente de autores, de fixações fonográficas manipuladas pelo DJ.
O DJ como autor musical
Para a consideração de um DJ poder ser tido como um autor, em sentido estrito, existe uma regra ainda em discussão: a de que a manipulação de uma gravação pré-existente resulte em que esta se torne totalmente irreconhecível da obra original sobre a qual se processou a sua intervenção. Esta regra, quase uma premissa, está na base da própria aceitação da obra resultante como uma criação original. Caso contrário, estaremos diante de um claro aproveitamento de obra anterior, identificável, sobre a qual o DJ terá exercido uma atividade de modificação, relacionada com o direito moral de seu autor e do intérprete (artigos 24 e 92 da LDA), e uma atividade de transformação da obra, relacionada com o direito patrimonial de autor/intérprete e do próprio produtor fonográfico (artigos 29, 89 e 93 da LDA).
As intervenções do DJ afetam a gravação e a própria obra gravada. A manipulação de uma fixação fonográfica -- em outras palavras, sobre a interpretação original de um outro artista -- pode ocorrer sobre a harmonia e a melodia da obra musical, que, por sua vez, têm como tributários o ritmo, o timbre, o estilo, o diapasão, o volume, enfim, todas as partes que constituem a gravação sonora. A fragmentação dos sons de uma gravação, o seu re-arranjo etc., operado pela manipulação por um DJ em seu processo de composição pode, ou não, permitir que a obra e a gravação original sejam identificáveis.
A exemplo do que ocorre com o sampleamento sonoro, grosso modo, estamos falando de uma replicação de sons previamente armazenados. Esse armazenamento prévio de sons permitem a recriação de escalas baseada em notas ou escalas de uma gravação original – considerada a “matriz genética” da obra resultante (C.P. Spurgeon, “Sampleamento Digital’, CISAC, 1992).
A intervenção do DJ, do mesmo modo, pode ser resultado de uma replicação. Resta saber se esse tipo de aproveitamento, assim como no sampleamento sonoro puro e simples, pode ser considerado ilícito quando se observa apenas partes da obra, já quase inidentificáveis, às vezes algumas notas musicais ou algumas palavras. Isto remete-nos, segundo o articulista citado, à necessidade de identificação de uma “semelhança substancial”, verificável através de critérios quantitativos e critérios qualitativos, na verdade, matéria de prova.
Conclusão
Os aspectos acima abordados, de modo superficial, o foram como uma tentativa de situar o fenômeno no campo jurídico. Estamos ainda diante de uma questão em aberto. A atividade do DJ e sua caracterização como intérprete e/ou como autor musical, está a merecer um aprofundamento, exigindo-se a sua confrontação com o próprio sentido de autoria e interpretação (ou execução), bem como com o princípio do fair use.
Disse o diretor da Scratch DJ Academy, Rob Príncipe, que é hora dessa nova forma de arte ter o mesmo tipo de respeito e legitimação que o jazz e o rock conseguiram. Esta é uma afirmação que, com a presença e a importância concomitantes dos DJ’s na música popular, constitui algo que não pode ser ignorado, e que deve ser tratado como um novo objeto de estudos para o Direito autoral.
Revista Consultor Jurídico, 23 de julho de 2004

Propriedade intelectual

Não há conflito entre novas tecnologias e direito autoral
por Glória Braga - Superintendente do ECAD
O direito de execução pública em face das novas tecnologias, como ringtones e Internet é um tema que assume relevante curiosidade em razão de um propagado conflito entre a evolução tecnológica, os direitos dos criadores intelectuais e a legislação autoral. Muito se tem discutido sobre isso. No meu sentir, entretanto, antes de tudo, existe, sim, um novo mundo, novos modelos de negócios, novos players, novas possibilidades de utilização de obras criativas. Nesse novo mundo, há lugar para todos. Sem aparentes conflitos. É disso, que vamos tratar.
A história da humanidade é marcada pelo descompasso entre a evolução social e a proteção legislativa. As leis caminham sempre atrás dos fatos e das mudanças ocorridas nas mais diversas sociedades do globo terrestre.
A história evolutiva do Direito Autoral está relacionada à possibilidade de se copiar obras literárias em grande escala e, conseqüentemente, de se proteger aqueles que viabilizavam as cópias (os editores) e aqueles que criavam as obras (seus autores). Desde então, muita coisa mudou.
O que não se pode perder de vista é que as obras intelectuais são protegidas pelas legislações do mundo como bens integrantes do patrimônio privado de seus criadores. Os autores exercem esses direitos de forma exclusiva, durante o prazo de proteção de suas criações, não podendo essas criações ser utilizadas sem autorização, salvo poucas exceções contempladas na legislação autoral.
Como poderão, então, conviver no mundo pós-moderno, criadores intelectuais e os cidadãos em geral sedentos de acesso aos bens intelectuais? Como sempre conviveram, respeitando regras criadas para disciplinar a utilização de obras protegidas, desde que essas mesmas regras não inviabilizem a difusão da cultura. As leis de direitos autorais são elaboradas com essa finalidade. Não há que se imaginar que um ramo do Direito, que tem sua fonte de inspiração em tratados internacionais e em acordos multinacionais de comércio, não esteja voltado ao equilíbrio desses dois direitos e interesses: dos autores e dos cidadãos.
Assim sendo, não há dicotomia entre as necessidades do avanço da tecnologia (e a conseqüente facilidade de disponibilização de obras criativas para um número quase infinito de usuários) e os direitos garantidos aos criadores, sem os quais, é bom que sempre se repita, não haveria obras criativas a serem disponibilizadas. Não podemos deixar que se instale um verdadeiro contra-senso. Os interesses de usuários de bens intelectuais não devem ser maiores que os direitos dos criadores. Por outro lado, não há como se imaginar que um novo modelo de negócio a ser implantado, num mundo globalizado, que conta com diferentes legislações, e no qual a rápida difusão das criações intelectuais é uma realidade, impossibilite essa difusão.
As possibilidades cada vez mais crescentes de utilização das obras criativas, dentre elas as músicas, objeto principal desta palestra, interessa e muito aos titulares de direito.
Com o passar dos séculos, graças a essas novas modalidades de uso, a música deixou de ser um privilégio dos poucos que compareciam às audições públicas e ao vivo das sinfonias de Mozart, Bach ou Schubert. O rádio, a televisão, o cinema, a gravação fonográfica e todas as novas formas de reprodução e difusão de músicas trouxeram para os compositores, músicos e cantores inúmeras alternativas para a difusão de suas criações. Por esta razão, não há que se falar em conflito entre os usos levados a efeito pela internet ou mesmo nos ringtones, truetones ou realtones e os direitos dos autores, pois nada mais são do que novas mídias e novas possibilidades de uso, tal qual um dia foram o rádio, a tv etc. O que há de se perseguir é, sim, a convivência lícita e possível entre, de um lado, os criadores e, de outro, todos aqueles que pretendam de uma forma ou de outra ter acesso a essas criações.
A Lei Autoral Brasileira
A lei autoral brasileira é uma das mais modernas do mundo. Foi promulgada sob a égide do TRIPS – Acordo sobre Aspectos do Direito da Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, acordo multilateral firmado pelo Brasil, no âmbito da OMC – Organização Mundial do Comércio. Por essa razão, insere no ordenamento jurídico pátrio conceitos mundialmente aceitos e que norteiam várias legislações nacionais sobre direitos autorais.
Como toda lei autoral, a lei brasileira não fala especificamente em mídias e, fatalmente, na internet, mas traça as diretrizes básicas e traz conceitos fundamentais para a identificação das diversas modalidades de utilização de obras intelectuais no mundo tecnológico atual. Dessa forma, se faz necessário extrair da lei autoral o princípio básico norteador da utilização de obras criativas (no caso presente, da música) e também listar as definições para alguns tipos de utilização musical possíveis quer no mundo analógico quer no digital.
Reza o artigo 28 da Lei de Direito Autoral (LDA) brasileira: “Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor de obra literária, artística ou científica”. Com base nesse dispositivo, que praticamente reproduz o inciso XXVII, do artigo 5o da Constituição Federal brasileira, o artigo 29 da LDA disciplina “Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:..” passando a listar de forma exemplificativa as inúmeras possibilidades de utilizações de obras criativas. Está identificado nesses dispositivos legais o princípio fundamental da legislação autoral, não apenas brasileira, mas de inúmeros países do mundo, razão pela qual se pode facilmente concluir que a utilização de bens intelectuais depende necessariamente de autorização prévia e expressa de seus autores ou de quem os represente. O legislador passa, então, a listar as modalidades de utilização de obras e, conseqüentemente, estão aí os direitos de natureza patrimonial dos criadores intelectuais.
O mais antigo deles, o direito de reprodução, encontra-se assim definido no artigo 5, inciso VI, da LDA: “reprodução – a cópia de um ou vários exemplares de uma obra literária, artística ou científica ou de um fonograma, de qualquer forma tangível, incluindo qualquer armazenamento permanente ou temporário por meios eletrônicos ou qualquer outro meio de fixação que venha a ser desenvolvido” .
A seu turno, o antigo direito de distribuição (cujo conceito foi importado do Marketing para identificar o direito que têm os autores de decidirem sobre a colocação em pontos de vendas de suas obras ou de cópias delas), na atual lei autoral, ganhou sua vertente tecnológica, a partir do momento em que a antiga distribuição de cópias físicas em pontos de venda se adaptou à nova realidade virtual. Segundo a lei autoral, em seu artigo 5, inciso IV, considera-se distribuição “a colocação à disposição do público de original ou cópia de obras literárias, artísticas ou científicas, interpretações ou execuções fixadas e fonogramas, mediante a venda, locação ou qualquer outra forma de transferência de propriedade ou posse”. Mais adiante, o artigo 29 inciso VII da mesma LDA também trata especificamente da chamada distribuição digital, definindo-a como “a distribuição para oferta de obras ou produções mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da obra ou produção para percebê-la em um tempo e lugar previamente determinados por quem formula a demanda, e nos caos em que o acesso às obras ou produções se faça por qualquer sistema que importe em pagamento pelo usuário.”
Por outro lado, alvo deste estudo, o direito de comunicação ao público vem disciplinado no artigo 5, inciso V, como o “ato mediante o qual a obra é colocada ao alcance do público, por qualquer meio ou procedimento que não consista na distribuição de exemplares” e a execução pública musical (artigo 68 parágrafo 2) como “a utilização de composições musicais ou lítero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de freqüência coletiva, por quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou transmissão por qualquer modalidade, e a exibição cinematográfica”. Assim, os conceitos de comunicação pública e de execução pública musical apresentam, com a nova lei autoral já adaptada à realidade digital, uma peculiar abrangência, que mais os assemelha à efetiva disponibilidade da obra musical para o usuário. E assim não poderia deixar de ser. As mais variadas formas de utilização ganharam, ante as novas tecnologias, possibilidades múltiplas todas voltadas para a disponibilização de obras musicais a um público existente não mais em um único lugar ou país, mas em todo o planeta.
Dessa forma, assume crucial importância para se entender o direito de execução pública no mundo digital, a compreensão do amplo conceito de transmissão existente na lei. Diz o legislador, no artigo 5 inciso II da LDA que transmissão ou emissão é “a difusão de sons ou de sons e imagens, por meio de ondas radioelétricas; sinais de satélite; fio, cabo ou outro condutor; meios óticos ou qualquer outro processo eletromagnético”.
Ora, fazendo a análise de todos os conceitos até aqui trazidos, pode-se concluir com facilidade que, por meio das mais variadas formas de transmissão, as obras musicais serão comunicadas ao público, ou seja, executadas publicamente. Quando o legislador pátrio manteve ligado à execução pública o conceito de transmissão já antevia que, no mundo digital, infinitas modalidades de transmissão seriam realidade, e que um dos conteúdos possíveis dessas transmissões seriam os bens intelectuais e, no presente caso, a música.
O aparente conflito
Quando uma música é utilizada em um site na Internet ou mesmo se transforma num ringtone, truetone ou realtone (modalidades de toques musicais difundidos por aparelhos de telefonia móvel), que tipos de utilização musical estarão acontecendo?
Poderão os conceitos dos mais variados direitos patrimoniais dos autores, anteriormente listados, ser suficientes para proteger o uso desses bens intelectuais no mundo digital? Que direitos possuem os compositores musicais e demais titulares sobre suas canções quando elas são utilizadas na Internet ou disponibilizadas no aparelho celular?
Valendo-se dos conceitos já mencionadas, se pode identificar alguns momentos distintos nessas utilizações e, conseqüentemente, direitos também distintos que devem ser preservados. Para tanto, não há se esquecer, em hipótese alguma, o que disciplina o artigo 31 da LDA, a saber: “as diversas modalidades de utilização de obras literárias, artísticas ou científicas ou de fonogramas são independentes entre si, e a autorização concedida pelo autor, ou pelo produtor, respectivamente, não se estende a quaisquer das demais.”
Assim, em geral, as utilizações de músicas na internet ou em outras mídias digitais necessitam de mais de uma autorização dos respectivos titulares de direito, pelo fato de serem verificadas várias modalidades de utilização e, conseqüentemente, de existirem vários direitos necessitando de regularização.
Música na Internet e a execução pública
O que precede qualquer utilização musical no mundo digital é a possível transformação ou adaptação da obra musical ou de seu respectivo fonograma para essa nova mídia. O que será utilizado será um fonograma previamente gravado ou a música precisará ser fixada especialmente?
Muitos compositores, por exemplo, entendem que suas canções se descaracterizam mesmo no caso dos realtones, ou ringtones polifônicos e, por essa razão, não concedem a necessária outorga para que o ringtone seja produzido. Portanto, sempre se deve ter em mente que, caso a música em seu estado original venha a ser utilizada ou mesmo adaptada para a utilização em internet ou em qualquer outra mídia digital, seus compositores e demais titulares de direito devem autorizar esse uso. Caso seja utilizado um fonograma, não apenas os compositores e demais titulares devem outorgar suas autorizações, mas também o produtor daquele fonograma.
Vencida essa etapa, há de se identificar a real utilização da música.
A música pode ser disponibilizada em um site na Internet com várias finalidades. Ela pode servir, por exemplo, como música de fundo no site; ela pode ser vendida, por meio desse site; ela pode ser ouvida, parcial ou integralmente, para efeito ou não de venda; ela pode servir para a montagem da chamadas “rádios virtuais”. Enfim, essas utilizações afetam quais direitos? Reprodução, distribuição, execução pública, todos eles ou alguns deles?
Quando anteriormente se tratou do direito de execução pública musical, ficou muito evidente que a comunicação de músicas ao público pode ocorrer de diversas formas: ao vivo, mediante radiodifusão, exibição cinematográfica ou transmissão por qualquer modalidade. Na internet ou em qualquer meio digital, qualquer utilização de música, independente de sua finalidade (venda de músicas, rádios virtuais etc.), se dá por meio de transmissões. Aí está presente o direito de execução pública musical. E nesse caso, não se diga, que a música necessariamente precise ser ouvida, mas ela precisa apenas ser o conteúdo dessas transmissões.
Ora, façamos uma correlação com o que ocorre com a radiodifusão: quando uma emissora de rádio transmite sua programação, e lá estão inseridas composições musicais, a emissora é responsável por obter a necessária autorização dos titulares de direitos sobre essas criações para radiodifundí-las. O mesmo ocorre com aquele que transmite obras musicais via Internet.
Não se pode, entretanto, descaracterizar o direito em razão das diferentes utilizações das músicas nas páginas de internet após suas transmissões. Essas diferenças serão mais bem tratadas não no momento da autorização para a comunicação ao público, mas sim, no momento do pagamento dos direitos autorais correspondentes. Isso porque é evidente que uma música que serve de fundo musical numa página de internet pode não ter a mesma importância de músicas disponibilizadas para a montagem de rádios virtuais. Assim, esses fatores serão levados em consideração no momento da fixação da retribuição autoral devida pelos responsáveis pelas transmissões.
Internet, ringtones e demais direitos patrimoniais
O fato de estar caracterizado o direito de execução pública musical nas utilizações digitais não significa que os outros direitos patrimoniais anteriormente indicados também não estejam presentes.
É evidente que, num site destinado a autorizar downloads de músicas, são preponderantes os direitos de reprodução e distribuição. O download é a evolução da antiga reprodução em LP ou CD. E o site ou, nesse caso, a loja virtual, a evolução da loja de CDs. Mas isso não descaracteriza o direito de comunicação pública e vice-versa.
Assim, podemos afirmar que a internet fez com que, pelo menos aparentemente, em um mesmo lugar ou num mesmo momento, vários tipos de utilização musical ocorressem, gerando ali vários direitos patrimoniais para os titulares dessas canções. Enquanto no passado, os momentos eram distintos e facilmente perceptíveis, hoje, na internet, os momentos continuam sendo distintos, mas existe certa dificuldade em se identificar cada um deles. Por exemplo: no passado, a música era gravada em um CD, esse CD era comprado pela emissora de rádio, a rádio fazia a radiodifusão dessa música e alguém a recebia em casa. Hoje, as músicas podem não ser mais gravadas em CD, pois ficam armazenadas no banco de dados de computadores ou servidores, e são baixadas diretamente para outros computadores. Nesse momento, se pode estar comprando a música ou apenas a escutando, mas a transmissão existiu. Por outro lado, hoje, os ringtones são armazenados em servidores e transmitidos para os aparelhos celulares. A impossibilidade de se visualizar a cópia física da música ajuda a se confundir os momentos e os direitos existentes.
Porém, por mais que os momentos sejam confundíveis numa primeira avaliação, estão aí presentes utilizações distintas, necessitando de autorizações específicas. Portanto, não há que se afirmar que as utilizações musicais na internet ou por meio de novas tecnologias não se encontram devidamente amparadas e previstas na legislação em vigor. O que tem ocorrido é uma confusão dos conceitos já existentes em razão da difícil identificação das utilizações que ocorrem quase que simultaneamente e no mesmo lugar, mas isso, repita-se, não descaracteriza os direitos consagrados.
As autorizações e a cobrança de direitos autorais
O que fazer para obter várias autorizações de uso de músicas? Recorrer aos titulares de direitos e junto a eles obter essas autorizações, na maioria das vezes, a partir do pagamento de direitos autorais.
Isso vem ocorrendo, sem maiores problemas, em lugares do mundo nos quais a gestão dos diversos direitos patrimoniais sobre as músicas é unificada. Explique-se melhor: se num site de venda de músicas ou mesmo na compra de um ringtone podemos identificar a reprodução musical (cópia), sua conseqüente distribuição digital, e perceber que isso tudo ocorre graças a uma transmissão, é evidente que vários direitos dos criadores dessas canções estão sendo utilizados. Quem dará essas autorizações?
Em vários países do mundo, nos quais os direitos de reprodução (cópia) e de execução pública musical são geridos em conjunto, quer diretamente pelos criadores, quer por suas associações de gestão coletiva, é fornecida uma autorização para ambas as formas de utilização e internamente os valores são creditados aos direitos de reprodução ( mechanical rights) e de execução pública ( performing rights). Existem estudos da CISAC – Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores – www.cisac.org - que sinalizam nesse sentido.
No Brasil, entretanto, essa gestão é partilhada. O direito de execução pública musical é gerido por meio das associações de gestão coletiva, representadas pelo ECAD – Escritório Central de Arrecadação e Distribuição. Os demais direitos, dentre eles os de reprodução e distribuição digital são administrados diretamente pelos compositores ou por suas editoras musicais e gravadoras. Nesse caso, as autorizações serão outorgadas por entidades distintas, cada uma autorizando os direitos que estão sob sua tutela.
Conclusão
A gestão dos bens intelectuais não difere da gestão dos bens materiais. Ela obedece a regras até muito pouco tempo quase desconhecidas para a maior parte da sociedade. Esse desconhecimento gerou forte impacto ante a revolução trazida pelas novas tecnologias e pela internet, as quais expuseram à discussão com maior veemência os direitos dos criadores e as necessidades de acesso às criações pela sociedade.
Vivemos um momento de acomodação dessa nova realidade. Portanto, é razoável que se verifique certa perplexidade, que sob hipótese alguma pode ser resolvida por uma insurreição generalizada contra conceitos legais há muito pertencentes ao ordenamento jurídico.
Não há que se falar também na dificuldade de controle das diversas utilizações musicais na internet como motivo para impedir a manutenção e cobrança de direitos autorais, flexibilizando-os em detrimento dos interesses dos criadores intelectuais. Novas alternativas tecnológicas já vêm sendo desenvolvidas no âmbito da comunidade mundial de autores musicais, com o intuito de facilitar a utilização de suas criações e a conseqüente regularização dos direitos. O DRM (Digital Rights Management), sistema de gerenciamento de direitos no mundo digital, já implementado para casos de reprodução de músicas e de obras audiovisuais vem alcançando resultados iniciais satisfatórios. No ano de 2004, por outro lado, registrou-se a diminuição dos downloads ilegais de música nos Estados Unidos, ante a proliferação de sites de venda de música legalizada. A já mencionada CISAC desenvolve um projeto mundial de codificação de músicas, livros, obras audiovisuais, titulares de direitos, fonogramas etc. que facilitará, no futuro, a identificação de títulos, titulares e administradores dos direitos autorais. O Brasil participa deste projeto por meio do ECAD (BrasilEcadNet).
Enfim, o mundo da música também pode ser administrado tecnologicamente. E para que esse mundo continue produzindo novas canções, os conceitos básicos e fundamentais dos direitos dos criadores devem ser preservados, não apenas no interesse desses criadores, mas também daqueles que pretendam continuar tendo acesso, licitamente, aos mais variados gêneros musicais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Ascensão, José de Oliveira Direito Autoral, 2ª Ed, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 1997.
Cabral, Plínio Revolução Tecnológica e Direito Autoral, Porto Alegre: Ed. Sagra Luzzatto, 1998
Cerqueira, Tarcísio Queiroz Software, Direitos Autorais e Contratos, ADCOAS, Rio de Janeiro: Fotomática Ed., 1993.
Costa Neto, José Carlos Direito Autoral no Brasil, Ed. FTD, 1998.
Gandelman, Henrique De Gutemberg à Internet: Direitos Autorais na Era Digital, Rio de Janeiro – São Paul: Ed. Record, 1997
Gouvêa, Sandra O Direito na Era Digital, Rio de Janeiro: Ed. Mauad, 1997.
Lange, Deise Fabiana O Impacto da Tecnologia Digital sobre o Direito Autoral e Conexos, São Leopoldo: Ed. Unisinos, 1996.
Scorzalli, Patrícia A Comunidade Cibernética e o Direito, Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 1997.
Silveira, Newton A Propriedade Intelectual e as Novas Leis de Direitos Autorais, São Paulo: Ed. Saraiva, 1998.
Revista Consultor Jurídico, 5 de julho de 20

august 21, 2006

O papel do ECAD - 17/08/2006

Direito Autoral: o papel do ECAD


Todo mundo conhece ou já ouviu falar do ECAD: Escritório Central de Arrecadação de Direitos. Entretanto, mesmo entre os músicos, pouca gente conhece bem seu papel, sua forma de atuação e os problemas que atingem o órgão.Apenas para situar a questão, vale dizer , de forma simplificada, que Direitos Autorais são aqueles que os autores de obras intelectuais detêm sobre suas criações . São protegidos por leis específicas (no Brasil, a Lei 9610/98) e por convenções internacionais, das quais o Brasil é signatário (Convenção de Roma e Convenção de Berna)A primeira coisa a ser dita sobre o ECAD, é talvez a estranheza de sua situação jurídica: trata-se de um órgão de natureza privada, que recebeu por lei federal o monopólio da arrecadação de direitos autorais de execução pública. Ainda do ponto de vista jurídico, ele encerra uma outra contradição: ainda que a associação , por força de nossa Constituição, seja livre, para receber o seu direito , o autor deve obrigatoriamente se filiar a uma das sociedades autorais existentes. O ECAD é administrado por 11 sociedades autorais, sendo que dessas apenas 6 , detentoras dos maiores volumes de arrecadação, têm direito a voz e voto . São elas: Abramus, Amar, Sbacem, Sicam, Socimpro e UBC. Todas as discussões sobre regulamentos, métodos de arrecadação e distribuição e seus valores correspondentes, são debatidos na Assembléia Geral do ECAD, e o voto é proporcional ao volume arrecadado por cada sociedade vale dizer que a sociedade que arrecada mais acaba determinando a política de arrecadação e distribuição. Há muitos anos, a sociedade que detém a maioria é a UBC, sendo portanto a que tem maior parcela da responsabilidade nas diretrizes que orientam a atuação do ECAD.Sobre os Direitos Autorais em música, devemos dizer que se dividem em dois tipos: os autorais propriamente ditos e os conexos. Os autorais , que representam 2/3 da renda da música, destinam-se aos autores e seus editores, em uma proporção variável de acordo com o contrato estabelecido entre as partes, mas que normalmente fica em torno de 25% para os editores e 75% para os autores. Já os conexos, que representam 1/3 da arrecadação, se dividem em 41,7% para o produtor fonográfico ( entenda-se aqui a empresa que registrou o ISRC dos fonogramas junto ao ECAD), 41,7% para o intérprete, e o restante rateado entre os arranjadores e os músicos participantes.A questão da arrecadação - A atuação do ECAD diz respeito à arrecadação e à distribuição dos direitos às diversas sociedades autorais, que se encarregam de repassar a seus associados. Para a administração e desenvolvimento de uma logística para arrecadação e distribuição, o ECAD retém um percentual de 18% sobre o valor arrecadado. A Sociedade, por sua vez, fica com 7% pela intermediação e repassa o restante, trimestralmente, a seus associados. Aliás, vale lembrar que o ECAD não realiza distribuição direta. Ele apenas arrecada e repassa às Sociedades Autorais, essas sim, responsáveis pelo repasse aos autores.|O sistema de arrecadação e distribuição enfrenta, porém, desde sempre, grandes desafios. Quem for conferir no site do ECAD, verá que várias informações fundamentais não constam ali. A começar pelo método de aferição da execução pública.Os valores cobrados pela execução obedecem a critérios definidos pelo próprio ECAD, e levam em conta a importância da música para a atividade ( indispensável, necessária ou secundária) , a periodicidade da veiculação (permanente ou eventual) e se a apresentação é feita por música mecânica ou ao vivo, com ou sem dança (www.ecad.org.br)Existem diferentes formas de se aferir a execução. Parte é feita de forma automatizada, parte por escuta, e parte pelas planilhas enviadas.Se o controle de forma eletrônica e automática é muito mais confiável e precisa ser expandido até chegar aos 100%, as outras formas são de uma fragilidade assustadora para um órgão que movimenta somas tão vultosas de dinheiro, por monopólio legal: métodos primitivos de escuta por amostragem lançam ao acaso o direcionamento do direito arrecadado. E traz ainda um outro problema, que é confiar a ouvidos nem sempre atentos a anotação e repasse da informação.Assim, muitas vezes sucede que o responsável pela escuta não identifica bem o nome ou os autores da música citada, ou troca uma palavra no título, ou anota uma palavra com a grafia errada e isso é suficiente para que a música vá cair na lista de músicas com crédito retido músicas que não conseguem ser identificadas pelo banco de dados do ECAD). Essas músicas ficam nessa categoria por cinco anos, à espera de identificação. Se passado esse tempo ela não for identificada, sua arrecadação correspondente é distribuída entre as 650 músicas mais executadas! (isso equivale a dizer, naturalmente, que autores menos conhecidos de músicas menos executadas normalmente o que cai no retido - com o pouco que deveriam receber, engrossam a arrecadação dos mais executados).Se somarmos a essa dificuldade de escuta o fato de nem sempre as rádios mencionarem os autores das músicas (como reza a lei do direito autoral), temos também que músicas com títulos iguais, em geral, ficam creditadas às mais conhecidas.No que diz respeito ao envio de planilhas, a questão também é complexa, pois pressupõe uma honestidade em sua confecção que nem sempre é observada ou pode ser comprovada. Afinal, não há nenhum método confiável de verificação da veracidade das planilhas e todo tipo de manipulação passa a ser possível.Quando a arrecadação é de usuários que se enquadram como usuários gerais ( academias de ginástica, cinemas, boates, lojas comerciais, bares, restaurantes, hotéis, supermercados, shopping centers, clínicas, etc.) a situação complica-se ainda mais. Afinal, o valor arrecadado não tem destinatário certo. Um exemplo, para que se entenda melhor: o condomínio de um hotel paga uma taxa mensal ao ECAD para tocar música ambiente. Entretanto, torna-se praticamente impossível o repasse da listagem das músicas que foram executadas e seus respectivos autores , pois o rádio pode ficar sintonizado em diferentes emissoras durante um mesmo dia sem qualquer possibilidade de controle.Assim, um órgão que tem do Estado o monopólio legal da arrecadação de direitos e que arrecadou em 2005, segundo seu site, R$ 254.747.161,25 , tem os destinatários de sua grande arrecadação, em grande parte, nas mãos de ouvidos mais ou menos atentos e preenchedores de planilhas mais ou menos fiéis. Isso porque o sistema de controle automatizado ainda não está amplamente implementado e não há uma fiscalização e nem auditoria externa para checar a veracidade das informações prestadas. Não por acaso, os músicos reunidos na Câmara Setorial da Música, em 2005, tiveram como principal reivindicação na questão do Direito Autoral a criação de um órgão de controle externo ao Escritório de Arrecadação.Um outro problema gravíssimo no campo da arrecadação é o alto índice de inadimplência. Numerosas rádios, TVs e demais usuários simplesmente não pagam o ECAD e hoje em dia há mais de 9.000 processos em andamento. O curioso é que entre os inadimplentes, encontramos inclusive órgãos públicos. Para os mais desconfiados, poderia haver inclusive uma conivência do ECAD com a inadimplência no sentido de favorecer advogados e alimentar essa indústria.Teorias conspiratórias à parte, o fato é que é inadmissível o nível de inadimplência, bem como a resistência ao pagamento mesmo quando a Justiça assim determina.Muitos veículos inadimplentes se utilizam da desculpa de que o que é cobrado não chega ao autor.No Congresso Nacional, tramitam atualmente vários projetos de lei buscando legalizar o não pagamento para as mais diversas atividades e veículos. Da tribuna, alguns parlamentares repetem o discurso de muitos veículos e instituições inadimplentes de que as taxas não beneficiam os autores. Se a afirmativa pode ser muitas vezes real, é curiosíssimo que parlamentares adotem publicamente a desculpa, deduzindo simplesmente que a solução é o não pagamento. Por esse raciocínio torto, e por analogia, uma vez que o dinheiro dos impostos que pagamos muitas vezes são desviados ou não chegam onde deveriam - , poderíamos então propor que simplesmente não houvesse mais nenhum pagamento de imposto.O pagamento do direito autoral , além de direito do criador, é muitas vezes sua forma única de sobrevivência. Logo, é fundamental que ele seja bem observado e controlado. É importante ainda que se faça uma campanha de conscientização da sociedade, no sentido de respeitar esses direitos, alertando para a importância do papel do criador e a necessidade de se proteger seu meio de vida, para que ele possa seguir criando.
Cristina Saraiva é compositora, produtora fonográfica e membro do Núcleo Independente de Músicos.

juli 06, 2006

'Era digital requer outro direito autoral'
Jornal da Tarde - 6/7/2006- Por Redação

Espécie de "segunda casa" do Creative Commons, o Brasil sediou, há duas semanas, o segundo encontro internacional dos líderes e simpatizantes do movimento, que militam por um direito autoral mais flexível e adequado aos tempos da web e do remix. Idealizado há 5 anos pelo professor da Universidade Stanford, Lawrence Lessig, o Creative Commons (www.creativecommons.org) oferece ao autor um conjunto de licenças que permitem "marcar" sua obra com certas liberdades - é permitido copiar e distribuir, por exemplo, mas não fazer uso comercial; ou ainda, é permitido copiar, distribuir e comercializar, mas esses direitos devem ser preservados na obra resultante. Como escreve Lessig em seu livro Cultura Livre, a bíblia do Creative Commons: trata-se de um modelo de "alguns direitos reservados" - um meio termo entre o "todos os direitos reservados"do copyright tradicional e o "nenhum direito reservado" do copyleft.

januar 27, 2006

PL 532 é crime de lesa cidadania - janeiro/2006

Para autores musicais, PL 532 é crime de lesa-cidadania.Obrigados pela justiça a pagar os direitos autorais, cartel das salas de cinema engendrou projeto de lei para cassar remuneração dos criadores musicaisEstá na pauta do Senado, para votação em segundo turno, um projeto de lei do cartel de salas de cinema, que cassa o direito dos criadores de receberem direitos autorais pelo uso de suas obras nas exibições cinematográficas. É o PL 532/03, que isenta os cinemas de pagarem direitos autorais pelas músicas dos filmes exibidos. O projeto foi apresentado pelo ex-senador João Capiberibe e pelo senador Paulo Otávio, proprietário de cinemas em Brasília. O relator é o senador Saturnino Braga, que é tio de Rodrigo Saturnino, hoje principal executivo da distribuidora norte-americana Columbia-Tristar e ex-diretor do condenado grupo Severiano Ribeiro, e tem como patrono na tribuna o senador César Borges, proprietário da Rádio Novo Rio, que chegou a ser fechada e lacrada pela Justiça baiana por sonegação de direitos autorais.
CALOTE
A cobrança de direitos autorais no cinema está na lei há mais de trinta anos. Entretanto, há cerca de 17 anos, o grupo Severiano Ribeiro (à época a maior rede de salas de cinema no Brasil) parou de repassar esses direitos. Como mau exemplo é fogo em palha, a Art Filmes e outros grupos exibidores também deixaram de pagar os direitos autorais devidos aos criadores, apesar de incluírem o percentual relativo a esses direitos no preço dos ingressos.. Em abril de 2003, o Superior Tribunal de Justiça determinou que os caloteiros estavam obrigados e pagar os direitos autorais e condenou-os a repassassem, aos autores musicais, com a devida correção, os direitos que haviam retido irregularmente no passado.
A sentença do STJ fixou jurisprudência para que outros grupos exibidores, igualmente devedores, sejam condenados a pagar. Não podendo ir contra a decisão de um tribunal superior, os exibidores decidiram alterar a lei que os condenou. É verdade que, mesmo que viesse a ser aprovada, essa nova lei não teria, em princípio, efeito retroativo, mas os amigos do alheio já se organizaram para tirar proveito. Seus advogados têm assediado as lideranças dos autores musicais com propostas do tipo: Os devedores cotizam-se para pagar a dívida dos condenados, que passa dos 50 milhões de reais, e o Ecad retira todas as ações contra os outros caloteiros. Depois, acreditam eles, a nova lei dispensa-os de pagar no futuro e esse acordo os livraria de pagarem, também, o que empalmaram no passado. Além disso, como a sentença do Superior Tribunal de Justiça ainda está na fase de perícia, a aprovação de tal lei abriria caminho para outros tantos anos de chicanas protelatórias. OMISSÃOEsta é a razão para a maquinação do projeto de lei 532/03. E, é claro, que para defender tão elevados interesses foi escalada uma seleção de desprendidos especialistas. Já, de seu lado, o ministro Gilberto Gil não tugiu nem mugiu sobre a questão, mantendo uma omissão conivente.O argumento mais divulgado pelos capitães-do-mato das norte-americanas Columbia-Tristar, Cinemark, UCI, etc. e do alinhado Severiano Ribeiro, é que, como 95% dos filmes exibidos são norte-americanos não é justo mandar esse dinheiro todo para os autores americanos, ainda mais que, argumentam, os cinemas americanos não pagam esses direitos autorais. Só faltava essa! Os monopólios do império e seus associados estão empenhados em defender os interesses nacionais brasileiros contra a rapinagem que eles próprios praticam! Vieram para o Brasil, usaram de todos os meios para quebrar e fechar as distribuidoras e as salas de cinema nacionais (fazem lobby desenfreado para impedir qualquer aumento da quota de tela), monopolizaram a exibição com os tais 95% de filmes americanos e ainda argumentam que não querem pagar direitos autorais para defender o cinema brasileiro.
Outro argumento que tem sido usado à exaustão é que a cobrança desses direitos autorais prejudica o desenvolvimento do cinema nacional. Os direitos autorais, que, em média, correspondem a um vigésimo do preço de um saco de pipocas, seriam os responsáveis pelo preço altíssimo dos ingressos, espantando o público e desencadeando, assim, uma seqüência de retraimentos prejudiciais ao potencial crescimento da produção nacional. Devem referir-se aos 5% que ainda deixam para os filmes brasileiros dividirem com as produções do resto do mundo.DIREITO ADQÜIRIDOO que os agitados senadores escondem é que esse projeto agride todas as práticas e normas internacionais de proteção à Propriedade Intelectual, principalmente o Convênio de Berna, do qual o Brasil é signatário. E que implica no rompimento de tratados e contratos internacionais firmados pelo Brasil, o que provocará sanções contra o nosso país, particularmente no âmbito da Organização Mundial de Comércio – OMC. Além de violar uma cláusula pétrea da Constituição Federal, que determina: “aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar” (Art. 5º, inciso XXVII).
“A Constituição Federal, além de garantir do direito à propriedade (Art. 5º, inciso XXII), reza expressamente que nenhuma lei pode prejudicar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (idem, inciso XXXVI). A cobrança de direitos autorais no cinema é direito adquirido há mais de trinta anos, constitui ato jurídico perfeito (vigente em todo o mundo civilizado) e sua legalidade foi confirmada por uma sentença do Superior Tribunal de Justiça. O PL 532/03 afronta todos esses princípios, apunhala a cidadania e rasga a Carta Magna, que sequer pode acolher emendas que visem abolir quaisquer direitos e garantias individuais. Querer aprovar uma lei para expropriar sumariamente os direitos dos criadores, chega a ser risível, não fosse trágico.”, destacou Marcus Vinícius de Andrade, presidente da Associação de Músicos, Arranjadores e Regentes – Amar/Sombras, e autor de mais de trinta trilhas sonoras de filmes brasileiros.
Mas também “desconhecem” que existem regras de reciprocidade internacional e que os criadores brasileiros recebem direitos autorais do exterior sobre itens dos quais não há cobrança equivalente em nosso país. “Além de expropriar os criadores nacionais, o PL 532/03 também afrontará os autores internacionais: será que Michael Jackson ou os herdeiros de Cole Porter concordarão em saber que não mais detêm direitos sobre suas próprias obras no Brasil? Isso certamente ensejará um clamor mundial contra o Brasil que, além de retaliações comerciais no âmbito da OMC, poderá até sofrer a interdição de filmes estrangeiros em seu território. Também ao contrário do que pensam os nobres senadores, a produção cinematográfica nacional será seriamente prejudicada: se impossibilitados de auferir direitos pela execução pública de suas obras, os criadores musicais (e também a indústria fonográfica e os editores musicais) terão de cobrar antecipadamente pela inclusão de músicas nas trilhas sonoras dos filmes, com isso onerando substancialmente os já minguados orçamentos de produção” lembrou o presidente da Amar/Sombrás.
COPYRIGHTS
Os Estados Unidos não recolhem um percentual dos ingressos para repassar para os autores. O sistema de copyrights prevê que o pagamento desses direitos seja feito previamente. Assim, não mandam esse percentual para o Brasil, nem para nenhum outro país, apesar de receberem do resto do mundo.. Mas mandam muito dinheiro de direitos autorais pela execução de músicas brasileiras em rádio e televisão e não recebem do Brasil, já que, vide exemplo da rádio do senador César Borges, as rádios e as tvs brasileiras só pagam na Justiça, depois de décadas de tramitação dos processos em que invariavelmente são condenadas. Aliás, os Estados Unidos também não recebem direitos autorais pela exibição nos cinemas há muito tempo: O cartel das salas de exibição não pagou durante 17 anos.
RECIPROCIDADE
Mas a reciprocidade internacional funciona. Os autores estrangeiros são tratados em cada país como os autores da terra. Cada um paga para os outros em função do que usa e recolhe. A Espanha, por exemplo, paga para os autores brasileiros direitos pela execução de música nas touradas e, obviamente, não recebe nada correspondente.
Ademais qual é o problema dos exibidores de cinema, que lucram com a obra criada por outros, pagarem direitos autorais para criadores estrangeiros? Cada obra de arte é única. A música de cada autor americano, inglês, francês, etc. é uma obra única, portanto sem igual aqui ou em qualquer outra parte do planeta. É justo que o autor tenha o seu trabalho remunerado. O que o Brasil não precisa é que algumas distribuidoras e organizações norte-americanas venham distribuir filmes e montar salas de cinema. Afinal, os brasileiros já sabiam fazer isso muito bem antes deles invadirem. Basta lembrar da extinta Embrafilme e do exemplo do velho Luiz Saveriano Ribeiro, que começou com o cinema Moderno, em 1921, em Fortaleza e chegou a ter a maior rede de salas de exibição do Brasil, rede, infelizmente, agora em acelerado encolhimento por obra dos “júniors” e seus brilhantes executivos sempre prontos a enfiarem-se debaixo da Columbia-Tristar.
JOÃO MOREIRÃOhttp://www.brasilcultura.com.br/conteudo.php?id=1353